Em 60 anos, com pagamentos mensais corrigidos pela taxa Selic, Minas Gerais está disposta a receber os R$ 135 bilhões devidos pela União ao Estado, por conta de perdas sofridas com a Lei Kandir desde 2006. Sobre perdas futuras decorrentes da desoneração do ICMS tratada na lei, o Estado abriria mão da metade do montante estimado, para que a União assuma o pagamento.
Na manhã da quarta-feira (18/07), o presidente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), deputado Agostinho Patrus (PV), afirmou que: “Essas duas somas representariam ao ano algo em torno de R$ 6 bilhões, a partir do próximo ano para o Estado, se tornando, assim, uma viabilidade para a situação de crise que Minas vive”.
No Salão Nobre da ALMG foi feito o anúncio do presidente, após o deputado ter recebido representantes dos Poderes do Estado, convidados por ele para a construção de uma proposta conjunta a ser defendida por Minas, no Supremo Tribunal Federal (STF), em 5 de agosto, durante audiência de conciliação sobre o assunto agendada pelo ministro Gilmar Mendes.
Acordada na reunião, da qual participou o governador Romeu Zema, a proposta resultou na Carta de Minas, documento de apoio à proposta do Estado para a recuperação das perdas advindas da Lei Kandir, como é conhecida a Lei Complementar Federal 87, de 1996.
O pagamento de ICMS sobre as exportações de produtos primários e semielaborados ou serviços foi isentado pela norma, levando à perda de arrecadação desse imposto por parte dos estados, sem que fosse feita a compensação prevista.
Agostinho Patrus, defendendo que essa deve ser uma bandeira de todos os segmentos, frisou que: “Vamos agora iniciar um grande movimento para que diversos setores da sociedade, prefeitos e lideranças em geral assinem a Carta de Minas”.
O parlamentar ainda afirmou que: “Receber essa dívida é um direito de Minas. Independentemente de coloração partidária, é preciso que todos se unam nessa causa para que o Estado saia forte no dia 5”.
O intuito da divulgação da proposta de Minas, de acordo com o presidente da ALMG, é que demais estados afetados pela Lei Kandir também engrossem a proposta capitaneada pela Assembleia e que será levada ao STF, visando uma conciliação entre estados e a União para um problema que se arrasta há anos, inclusive com ações na Justiça.
Minas é dos estados mais prejudicados, de acordo com deputado
Tratada na Lei Kandir, a isenção levou à perda de arrecadação de ICMS por parte dos estados, sendo Minas um dos mais prejudicados em função da isenção sobre o minério de ferro. O presidente da Assembleia, em entrevista à imprensa após o encontro, ainda divulgou dados de análise comparativa feita pela equipe técnica da Assembleia demonstrando que Minas tem sido um dos estados mais penalizados na questão.
Somente no ano passado, o deputado disse que o Estado do Rio de Janeiro recebeu mais de R$ 13 bilhões em arrecadação com os royalties do petróleo, enquanto Minas recebeu apenas R$ 250 milhões com arrecadação relativa à Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem), que incide sobre o minério de ferro, por exemplo.
O deputado, em referência ao rompimento das barragens de Fundão, em Mariana (Região Central), ocorrido em 2015, e em Brumadinho (Região Metropolitana de Belo Horizonte), em janeiro deste ano, advertiu que: “Sabemos que a exploração do petróleo se dá longe da costa, em águas profundas, ao contrário da mineração, que já nos trouxe duas tragédias recentes e tantos problemas em questões como a rodoviária”.
Meio termo - O presidente da Assembleia ressaltou que o documento acordado para que Minas deixe de ser tão prejudicado traz uma proposta de meio termo, de forma a tornar possível o ressarcimento ao Estado. Um prazo maior para o pagamento das dívidas pela União, segundo Agostinho Patrus, foi pensando de forma a não gerar repercussão mais drástica no caixa da União.
O deputado, para quem o teor do documento foi estudado justamente para possibilitar um acordo, prevê que: “É uma proposta palatável e de meio termo, que tem condições de ser despachada pelo ministro Gilmar Mendes”.
O presidente da ALMG foi questionando sobre se os montantes que podem vir a entrar no caixa de Minas, em função desse acordo, resolveriam a situação de crise no Estado, que por sua vez também deve à União. O reforço no caixa de Minas poderá até vir a facilitar um encontro de contas, de acordo com o deputado, mas ressaltou sobretudo que ele poderá permitir melhorias em investimentos para áreas como saúde, educação e infraestrutura.
O ressarcimento das perdas da Lei Kandir, para o presidente da Assembleia, é essencial para o Estado. Por isso, é um dos destaques do movimento Sou Minas Demais, lançado pela ALMG com o objetivo de buscar caminhos para Minas superar a crise econômica.
Poder Executivo vê acordo possível
Segundo Sérgio Pessoa de Paula Castro, titular da Advocacia Geral do Estado (AGE), a Carta de Minas representa um movimento institucional para se buscar de fato o ressarcimento de perdas, enfrentadas ao longo dos anos, com a isenção do ICMS.
Quanto à proposta acordada, o mesmo avaliou que: “Acordos pressupõem que uma parte ceda, o que foi feito com critérios de proporcionalidade e razoabilidade”.
Sérgio, com base em estudos técnicos, detalhou que compensações futuras devidas aos 15 estados, por conta da Lei Kandir, estão estimadas em R$ 39 bilhões por ano e a proposta de Minas é de que os estados abram mão de praticamente a metade desse valor, recebendo R$ 18 bilhões. Para o pagamento desses R$18 bilhões, haveria a repartição aos estados, de acordo com critérios já estabelecidos pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), pelos quais o titular da AGE estima que 15% caberiam a Minas por ano.
Foi indagado se, ao advogado-geral do Estado, uma vez aceita a proposta de Minas para repor perdas da Lei Kandir, o Estado não precisaria mais se valer de um projeto de recuperação fiscal, uma das exigências da União para aportar recursos aos estados em dificuldades financeiras.
O representante do Executivo, quanto à crise financeira por que passa o Estado, acenou que: “Virá recurso novo com um acordo sobre a Lei Kandir, mas é preciso compreender que isso por si só não será suficiente. Precisamos de um conjunto de medidas, e esse debate sobre a recuperação fiscal deve continuar”.