Na última quarta-feira (12), o Plenário do Senado aprovou o projeto de lei que remove o sigilo bancário das operações de empréstimo realizadas com recursos públicos, sejam elas feitas por bancos privados ou estatais. A medida só vale, no entanto, para as operações em que haja contrapartida de Estado estrangeiro ou se o empréstimo contar com a garantia direta ou indireta de outro país. O PLS 26/2014, do senador Álvaro Dias (Podemos-PR), segue agora para a Câmara dos Deputados.
Coube ao senador Styvenson Valentim (Podemos-RN) a relatoria final do projeto. Ele não aceitou integralmente a emenda apresentada no Plenário pelo senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE). O líder do governo queria que, em caso de operações policiais, as contas bancárias que tenham sido usadas para a movimentação de dinheiro público também não fossem mais protegidas pelo sigilo. Mas essa parte não foi acatada pelo relator.
A proposição modifica a lei do sigilo bancário (Lei Complementar 105, de 2001). Na sua versão original, ela se referia apenas a empréstimos de bancos públicos para outros países ou que contassem com garantia, direta ou indireta, de nações estrangeiras. Uma emenda do ex-senador Flexa Ribeiro, na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE), estendeu a medida para quaisquer operações feitas por bancos públicos que usarem, total ou parcialmente, recursos provenientes do Orçamento público.
Uma emenda por Bezerra, por fim, determinou que bancos privados também sejam alcançados pela retirada do sigilo quando efetuarem operações de empréstimo com dinheiro público desde que houvesse contrapartida ou garantia direta ou indireta de nações estrangeiras.
O projeto, além disso, determina que os instrumentos contratuais e eventuais aditivos das referidas operações sejam divulgados em página específica da instituição na internet. Originalmente, previa-se também a divulgação em jornal impresso de grande circulação, mas essa regra foi removida.
Cuba
Álvaro Dias, ao apresentar o projeto, criticou investimentos feitos com o auxílio de dinheiro brasileiro em outros países, citando, como exemplo, o empréstimo de US$ 800 milhões concedido a Cuba para a construção de um porto na cidade de Mariel. Em Plenário, ele disse que essas operações foram procedimentos “inusitados”, que surpreenderam pela falta de transparência.
Os empréstimos foram financiados com a emissão de títulos de dívida a juros altos, segundo Álvaro, e também com a retirada de recursos de fundos públicos. De acordo com ele, o país perderá mais de R$ 342 bilhões até 2060 para arcar com os atos.
O mesmo afirmou que: “Colocamos a mão no bolso dos trabalhadores brasileiro. Transferimos recursos do FAT e do FGTS ao BNDES para empréstimos favorecidos aos chamados ‘campeões nacionais’, e a nações que não pagam”.
O autor do PLS destacou, ainda, que o seu projeto não pretende violar o direito constitucional à privacidade, pois incide apenas sobre transações financeiras que usam dinheiro público. Por outro lado, o senador Humberto Costa (PT-PE) disse que o projeto é meritório, mas que ele nasce de “preconceito” e de “fake news” a respeito dos contratos firmados em outros países com dinheiro brasileiro. Segundo ele, os financiamentos já geraram retornos, na forma de empregos, aquisição de equipamentos e crescimento de empresas nacionais.
Ele argumentou que: “Quando o Brasil financia trabalhos de empresas brasileiras, está beneficiando o país. Esses recursos serão repatriados”.
Humberto também destacou que, apesar da maio visibilidade dada a empréstimos em países como Cuba, Venezuela e Moçambique, o país que mais recebeu recursos brasileiros foram os Estados Unidos.
Emendas
O projeto passou por três comissões, tendo sido modificado apenas na primeira, a CRE. As emendas do relator Flexa Ribeiro ampliaram o alcance do texto para estender a extinção de sigilo bancário a todas as operações de crédito de bancos públicos, custeadas com recursos públicos.
Na ocasião, o senador argumentou que: "[A] publicidade não deve se limitar aos empréstimos a países estrangeiros ou por eles garantidos [...] Devemos considerar que qualquer financiamento que tenha como fonte os recursos públicos, assim definidos como os recursos provenientes de aportes diretos ou indiretos do Tesouro do ente público controlador, deve ser tornado transparente".
As comissões de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e de Assuntos Econômicos (CAE), depois da CRE, ratificaram as mudanças. Quando o projeto chegou ao Plenário, o senador Fernando Bezerra Coelho propôs incluir os bancos privados na nova norma, quando eles se valessem de verbas públicas para efetuar empréstimos. Bezerra observou que a diferenciação seria inconstitucional, ao prejudicar a isonomia entre empresas públicas e privadas do mesmo ramo. Além disso, segundo ele, incluir os bancos privados permitiria ao projeto alcançar "por completo" o seu objetivo de conferir mais transparência ao uso do dinheiro público.
A emenda de Bezerra também dispõe que o princípio do sigilo bancário não poderá ser usado para proteger de investigações policiais, contas que tenham sido usadas para a movimentação de recursos de origem pública. Para o senador, essa determinação dará mais "segurança jurídica" às instituições para que forneçam documentos pertinentes a autoridades.