A partir das eleições de 2020, os partidos estão proibidos de formar coligações para disputar cargos nas Câmaras Municipais, Assembleias Legislativas e na Câmara dos Deputados. Isso significa que, agora, o que será levado em conta é a votação de cada legenda, e não mais a soma dos votos obtidos por todos os membros do bloco.
Isso tende a prejudicar partidos menores que, sozinhos e com menos recursos, podem não obter número suficiente de votos para conquistar um assento. Por outro lado, evita que candidatos muito bem votados ajudem a eleger vereadores de outros partidos, nem sempre muito alinhados ideologicamente.
Abaixo, entenda como funciona a distribuição de vagas no Legislativo e o que muda nas próximas eleições.
O que é uma coligação e para que ela serve?
Uma coligação é um grupo formado por partidos para somar forças na disputa eleitoral. Nas coligações para cargos majoritários (prefeito, governador e presidente), servem para indicar apoio a um candidato e calcular o tempo de propaganda gratuita a que cada um tem direito. As formadas para as eleições proporcionais (Câmara dos Deputados, Assembleias Legislativas e Câmara Municipais) serviam para que os partidos somassem os votos e concorressem como um grupo só, o que tende a beneficiar principalmente as legendas menores.
O que muda em 2020?
A partir de 2020, os partidos não poderão mais formar coligações para concorrer às eleições proporcionais. Essa regra foi aprovada pelo Congresso em 2017, mas avaliou-se que as legendas precisavam de um tempo para se adaptar.
Todas as coligações estão proibidas?
Não. Os partidos ainda podem formar coligações para a disputa de cargos majoritários. Isso é importante, por exemplo, para calcular o tempo a que cada candidato a prefeito terá direito na propaganda gratuita no rádio e na TV.
Como os votos eram contabilizados quando as coligações eram permitidas?
Os partidos podiam decidir concorrer sozinhos ou em coligações, ou seja, em blocos. Nesse último caso, a votação considerada é a soma dos votos obtidos por cada partido membro da coligação.
E como as vagas eram distribuídas?
Finalizada a eleição, todos os votos válidos (ou seja, excluídos os nulos e os brancos) são somados e divididos pelo número de assentos na Casa (no caso da Câmara dos Deputados, a divisão leva em conta o número de cadeiras a que o estado tem direito). O resultado obtido é chamado de quociente eleitoral.
Depois, cada coligação (ou partido, caso a legenda tenha concorrido sozinha) tem calculado um outro quociente, o partidário. Dessa vez, os votos que todos os membros do grupo receberam são somados e divididos pelo quociente eleitoral.
No cálculo do QP, despreza-se a fração —se o resultado da divisão for 5,8, o quociente partidário é 5. Isso significa que o partido ou coligação terá direito a 5 vagas, e quem tem 0 não consegue nenhuma vaga. As cadeiras que restam são chamadas sobras, e a divisão atende a um critério um pouco mais complexo (veja abaixo), mas ainda baseado no quociente partidário.
O sistema de distribuição continua o mesmo. O que muda agora é que os partidos concorrem sozinhos.
Como funciona a divisão das sobras?
Para definir quem fica com as vagas que sobram, é feito um novo cálculo. Desta vez, divide-se o total de votos da coligação pelo número de cadeiras que o partido ou grupo já garantiu mais 1. Se uma legenda, a partir da divisão anterior, obteve 3 assentos, então o quociente partidário será dividido por 4 (3+1).
A legenda que obtiver a maior média ganha a primeira cadeira. A conta se refaz, considerando sempre o número de vagas que cada partido conquistou na última rodada, até que se esgotem os assentos.
Se uma legenda levou 8 cadeiras na primeira divisão (quociente partidário) e mais uma na primeira rodada da distribuição da sobras, ela terá o número de votos obtidos dividido por 10 (8+1+1).
Antes, só participavam da distribuição das sobras os partidos que tivessem quociente partidário maior que 0. Desde 2018, contudo, todos disputam essas vagas.
O que define quem vai ser eleito dentre os muitos candidatos do partido?
A ordem de votação nominal, ou seja, quem foi mais votado dentro da legenda.
E o que muda na contagem do próximo pleito?
Os partidos agora disputam sozinhos, ou seja, a votação não é somada com outras legendas. De resto, as regras são as mesmas da eleição de 2018 para Câmara e Assembleias.
Quem se beneficia e quem se prejudica com o fim das coligações?
Em geral, as coligações ajudavam a eleger, no Legislativo, partidos menores, que se juntavam às legendas mais fortes para conseguir pleitear um assento que, sozinhos, dificilmente obteriam. Sem elas, os partidos maiores devem conquistar mais assentos.
Um exemplo que ocorreu em São Paulo, em 2016: PT, PDT, PR (hoje PL) e PROS formaram uma coligação. No total, a coligação teve 1.190.807 votos —o valor representa a soma da votação de cada partido.
Sozinho, o PROS teve 44.290 votos e não conseguiria eleger um representante. Graças à coligação, conseguiu uma vaga na Câmara. Já o PDT (128.987 votos) ficou de fora, mesmo fazendo parte da coligação e tendo mais votos que o PROS.
Na seleção dos mais votados do bloco, Ricardo Teixeira (PROS) ficou em 11º. DR. Calvo, o candidato que teve melhor votação no PDT, ficou em 18º, sem conquistar, portanto, uma das 14 vagas a que a coligação teve direito.
Por que se dizia que as coligações "enganavam" o eleitor?
Quando um candidato tem uma votação muito expressiva, infla o quociente partidário e acaba por “puxar” outros da mesma coligação —ou seja, pode eleger políticos de um outro partido. Como nem sempre as coligações são formadas por simples alinhamento ideológico, uma pessoa pode votar em um candidato progressista e acabar elegendo um outro de um partido conservador, e vice-versa.
Um candidato com muitos votos ainda pode ajudar a eleger outros com votação inexpressiva?
Agora, um candidato bem votado ainda pode puxar outros sem tantos votos, mas todos eles serão da mesma legenda. Uma regra em vigor desde 2018, contudo, define que só podem ser eleitos aqueles que tiverem votação igual ou superior a 10% do quociente eleitoral (divisão do total de votos válidos da eleição pelo número de vagas).
A ideia é evitar que sejam eleitos candidatos sem nenhuma expressão nas urnas. Um estudo das pesquisadoras da FGV Lara Mesquita e Gabriela Campos, entretanto, mostrou que, de 1998 a 2014, só nove deputados federais foram eleitos sem votação de no mínimo 10% do QE de seu estado —todos eles em São Paulo. Dos nove, cinco foram puxados por Enéas Carneiro (Prona), em 2002, e quatro por Celso Russomanno (PRB), em 2014.
Fonte: Flávia Faria /FSP
Foto: Arquivo jornal Panfletu´s