Apenas Minas Gerais e Alagoas em que as variantes não foram predominantes, após exames RT-PCR comuns.
As variantes do coronavírus com maior potencial de transmissão e possivelmente mais letais já dominam seis estados do país, além do Amazonas, de acordo com um estudo da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz).
O estudo avaliou cerca de mil amostras do vírus coletadas em oito estados brasileiros das regiões Nordeste, Sul e Sudeste: Alagoas, Ceará, Minas Gerais, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Santa Catarina.
Dos oito estados avaliados, seis demonstraram a presença da variante como dominante, ou seja, com prevalência maior de 50% das amostras analisadas: CE (71,1%), PR (70,4%), PE (50,8%), RJ (62,7%), RS (62,5%) e SC (63,7%). Apenas dois dos estados avaliados não apresentaram a presença predominante da variante: AL (42,6%) e MG (30,3%).
A análise identifica a presença de uma das três variantes de preocupação (chamadas de VOCs, em inglês) do Sars-CoV-2, a britânica (B.1.1.7), a sul-africana (B.1.351) e a brasileira ou de Manaus (P.1), que se espalharam por todo o mundo e geram receio por serem mais transmissíveis e, no caso das formas da África do Sul e do Amazonas, diminuírem a ação de anticorpos que garantem proteção imune.
No entanto, nos testes realizados não é possível distinguir entre as três variantes, ou seja, a prevalência apontada pode se referir a qualquer uma das três —ou até mesmo a um conjunto delas.
Diferentemente do método de sequenciamento genômico, que busca novas variantes do vírus existentes e aquelas ainda não conhecidas, o estudo da Fiocruz utilizou testes de RT-PCR, iguais aqueles utilizados para o diagnóstico de pacientes infectados com o vírus, para detectar as variantes de preocupação.
A novidade em relação ao teste comum é a ferramenta de busca por uma parte do gene que codifica a proteína S do Spike do vírus (usado como porta de entrada para infectar as células) que, nas três variantes, apresenta uma deleção —ou seja, não existe na variante.
Caso o teste “acenda” para essa região, os pesquisadores podem descartar que aquela amostra seja de uma linhagem ancestral do vírus, que não possui a deleção.
Em um estudo com 91 amostras coletadas na Grande São Paulo, o novo teste apontou a incidência de 77% dessa linhagem de alto potencial transmissível na região. Segundo José Eduardo Levi, coordenador de pesquisa e desenvolvimento do Dasa e pesquisador do IMT/USP, quanto mais forte a presença de uma variante em um conjunto amostral, maior a prevalência dessa linhagem na população.
“Se hoje estamos falando de prevalência da P.1 em torno de 80%, 90%, testar de 100 a 200 amostras que sejam representativas do universo [de casos] já é suficiente para verificar essa presença mais dominante”, diz.
Camila Romano, pesquisadora do Hospital das Clínicas da USP e do IMT/USP, um caso emblemático é o colapso recente em Araraquara. “Na metade de janeiro para o início de fevereiro, analisei algumas amostras vindas de lá que apontaram incidência de 84% da P.1. De 18 de fevereiro para cá, todas as amostras que eu sequenciei de Araraquara eram da P.1.”
A bióloga criou um protocolo similar ao desenvolvido pela Fiocruz, mas com uma vantagem: o teste é capaz de detectar infecção ao mesmo tempo por duas linhagens distintas do coronavírus. “Temos hoje várias linhagens circulando ao mesmo tempo no país e, pior, com chance de contaminação com mais de uma cepa”, afirma.
A possibilidade de reinfecção associada a essa linhagem também afeta o sistema de saúde, que fica sobrecarregado com mais pacientes com necessidade de atendimento hospitalar. Para a pesquisadora, em todos os lugares que há colapso hoje, se houver testagem, vai ser detectada a P.1.
Por ser mais rápido e com menor custo do que o sequenciamento, o teste desenvolvido por Romano vem sendo utilizado também em outros laboratórios de pesquisa que buscam monitorar a circulação do vírus no país, incluindo o Dasa.
O principal entrave é, no entanto, na importação de insumos e reagentes, especialmente na rede pública. Romano conta que usaram insumos do grupo de colaboração do Reino Unido e, simultaneamente, fizeram o pedido de importação dos reagentes. "Já usamos todos os reagentes da Inglaterra e o pedido que fizemos no país ainda nem sequer chegou”, diz.
Além dos problemas de importação de insumos, a falta de recursos para pesquisa também dificulta os estudos de evolução de vírus e o sequenciamento genético.
Por isso, o tempo gasto é muito maior, além dos equipamentos utilizados serem caros, afetam negativamente a chamada vigilância genômica no país.
O biomédico e doutor em ciências Raphael Parmigiani, explica que, caso houvessem mais recursos no país, o ideal seria fazer um sequenciamento genético mais agressivo das amostras. Na ausência deles, o uso dos testes de PCR em tempo real para buscar variantes quebra o galho.
“A estratégia que podemos empregar no país é uma combinação das duas tecnologias: fazer sequenciamento do maior número possível com o recurso que temos disponível, e para verificar a distribuição das variantes já conhecidas, usar o teste de PCR adaptado para detectar essas cepas, que qualquer laboratório de biologia molecular no país tem condições de fazer.”
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